terça-feira, 7 de julho de 2009

Declaração pública da Amnistia Internacional - Guiné Bissau

Guiné Bissau. Violações dos direitos humanos no período conducente às eleições presidenciais
11 de Junho de 2009

A Amnistia Internacional deplora os aparentes homicídios ilícitos e execuções extrajudiciais de políticos pelas forças armadas e receia que a situação dos direitos humanos continue a deteriorar-se ainda mais no período conducente às eleições presidenciais, marcadas para 28 de Junho de 2009.

A Amnistia Internacional está preocupada perante a prisão arbitrária de vários ex-membros do governo, tendo pelo menos um deles sido espancado na altura da sua prisão; outros esconderam-se, receosos pela sua segurança.

A organização apela às autoridades da Guiné Bissau para que abram de imediato uma investigação completa, transparente e imparcial à aparente execução extrajudicial de políticos pelas forças armadas, assim como à prisão arbitrária e espancamentos, e para que apresentem os responsáveis à justiça. A Amnistia Internacional apela ainda às autoridades da Guiné Bissau para que assegurem que os militares não sejam autorizados a prender ou a deter civis.

Quatro pessoas, incluindo dois políticos destacados, foram mortas na madrugada de sexta-feira, dia 5 de Junho de 2009. Várias outras pessoas foram presas após acusações por parte das forças armadas de tentativa de golpe de estado para derrubar o governo e matar o Primeiro-Ministro e o Chefe de Estado-Maior General das Forças Armadas. Sabe-se que os falecidos e os detidos eram próximos do falecido Presidente Bernardo “Nino” Vieira, que foi morto por soldados no dia 2 de Março de 2009. O homicídio do falecido Presidente seguiu-se ao do Chefe de Estado-Maior General das Forças Armadas, General Batista Tagmé Na Waie, algumas horas antes.

Helder Proença, ex-Ministro da Defesa, a quem o Chefe de Estado-Maior General das Forças Armadas acusou de ter dirigido a tentativa de golpe de estado, bem como o seu guarda-costas e motorista, foram mortos quando regressavam do Senegal. Foram mortos por volta da meia-noite, na Ponte Amílcar Cabral, a cerca de 40 km a norte de Bissau, onde soldados lhes fizeram aparentemente uma espera. Baciro Dabó, um ex-Ministro da Administração Territorial e candidato às eleições presidenciais que terão em breve lugar, foi morto em sua casa por volta das 2h da madrugada. Segundo os relatos, um grupo de aproximadamente 13 soldados entrou em sua casa e disparou contra ele. Alguns relatos sugeriram que ele foi atingido por três tiros no tronco e um na nuca.

Após os homicídios, o Serviço de Segurança Interna do Ministério do Interior emitiu uma declaração reivindicando que as forças armadas tinham conseguido evitar um golpe de estado na noite de 4 de Junho; que os alegados responsáveis estavam armados e que, embora alguns se tivessem rendido, outros resistiram à prisão, o que teria levado a uma troca de tiros, na qual quatro pessoas teriam sido mortas. Contudo, segundo os relatos, não há provas de que os falecidos estivessem armados ou de que tivesse ocorrido qualquer troca de tiros. Os Serviços de Segurança terão também apresentado uma gravação de vídeo e áudio, dos alegados golpistas, durante uma reunião na qual teriam acordado em levar a cabo o golpe de estado.

A Amnistia Internacional está também preocupada com a prisão arbitrária de um número indeterminado de ex-funcionários governamentais e com o espancamento de pelo menos um dos detidos.

As pessoas que foram presas incluem:

Faustino Fadut Imbali, um ex-Primeiro-Ministro que foi também preso na madrugada de 5 de Junho em sua casa. Foi espancado na altura da sua prisão e levado ao Quartel-General das Forças Armadas, onde tem estado detido sem acusação formal.
O Coronel Antero João Correia, Director-Geral da Segurança de Estado, e Domingos Brosca foram também presos e encontram-se detidos nas celas da Base Aérea em Bissau.
Yaya Dabó, o irmão mais velho de Baciro Dabó, foi preso no dia 8 de Junho depois de alegadamente dizer que vingaria a morte do seu irmão.

Todos eles foram presos por militares sem qualquer mandado de detenção. Vários outros indivíduos, incluindo Conduto Pina e Veríssimo Nacassa “Tchitchi”, estão alegadamente escondidos por recearem pela sua segurança.

Os detidos não foram presentes a um juiz para legalizar a sua detenção, tal como está previsto na lei da Guiné Bissau, que estipula que a legalização da detenção de todos os detidos deve ocorrer dentro de 48 horas. Além disso, as detenções foram efectuadas por oficiais do exército que não têm a autoridade para prender civis na Guiné Bissau, tendo-o portanto feito em contravenção da legislação nacional e internacional.

A Amnistia Internacional está preocupada pois acredita que a actual atmosfera de prisões arbitrárias e homicídios ilícitos não é conducente ao exercício da liberdade de expressão, uma condição essencial para o efectivo exercício do direito de voto. O Comité dos Direitos do Homem da ONU declarou no seu Comentário Geral Nº 25, interpretando o Artigo 25º do Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos, que “a liberdade de expressão, reunião e associação constitui uma condição essencial para o exercício efectivo do direito de voto e deve ser plenamente protegida.”

Informação de Contexto:

A Guiné-Bissau é um país altamente volátil e com um longo historial de golpes de estado e rebeliões militares. Uma breve guerra civil terminou com o derrube do falecido Presidente Nino Vieira do poder em Maio de 1999. Ele regressou ao país em 2005 para disputar as eleições presidenciais, que acabou por vencer. Desde 2000, os soldados mataram três Chefes de Estado-Maior General das Forças Armadas, assim como outros militares de alta patente. Os responsáveis pelos homicídios não foram submetidos à justiça. Em Agosto de 2008, o Contra-Almirante José Américo Bubo Na Tchute foi acusado de liderar uma alegada tentativa de golpe de estado contra o falecido Presidente Bernardo João Vieira. Ele conseguiu alegadamente evadir-se de prisão domiciliária e fugir para a Gâmbia.

No domingo, dia 1 de Março de 2009, o Chefe de Estado-Maior General das Forças Armadas, General Batista Tagmé Na Waie, foi morto num ataque à bomba no seu escritório no Comando Geral das Forças Armadas em Bissau. Horas mais tarde, na madrugada de segunda-feira, dia 2 de Março, num aparente ataque por vingança, soldados mataram o Presidente João Bernardo Vieira, que eles acreditavam ser o responsável pela morte do General Tagmé na Waie.
Não foram, até à data, efectuadas quaisquer investigações a estes homicídios. O Procurador-Geral afirmou recentemente que o seu gabinete não dispõe de dinheiro para proceder à investigação. Os Militares comprometeram-se a respeitar a Constituição e foi nomeado um novo Chefe de Estado-Maior General das Forças Armadas. De acordo com a Constituição, o Presidente da Assembleia Nacional assumiu interinamente as funções de Presidente até à realização de novas eleições presidenciais, que estão marcadas para o dia 28 de Junho de 2009. Contudo, a realização das eleições está em dúvida, pois a campanha eleitoral deveria ter começado no domingo, dia 7 de Junho. Nos termos da lei, a campanha eleitoral deve ter a duração de 21 dias. Contudo, até à data, as autoridades não fizeram qualquer anúncio sobre um possível adiamento das eleições.

No seguimento dos homicídios do Presidente Nino Vieira e do General Tagmé Na Waie, em fins de Março e princípio de Abril de 2009, Pedro Infanda, advogado, e Francisco José Fadul, um ex-Primeiro-Ministro, e à altura Presidente do Tribunal de Contas, foram presos e torturados por soldados por terem criticado as forças armadas. Imediatamente depois disso, membros da Liga Guineense dos Direitos Humanos (LGDH), incluindo o seu presidente, foram ameaçados por pessoas armadas após condenarem publicamente a prisão e tortura de Pedro Infanda e o espancamento de Francisco José Fadul.
Fonte: Amnistia Internacional